Já por várias vezes aqui referi o conceito de modelo de jogo e o tempo que é necessário para que um jogador adquira as rotinas necessárias para se enquadrar num modelo de jogo consistente. Ao contrário do que muitos defendem, não basta a um jogador ter qualidade para se adaptar a uma equipa, a não ser que estejamos a falar de uma equipa taticamente estupidificada, ou seja sem modelo de jogo que se veja.
Felizmente o Benfica é uma equipa que é taticamente evoluída e que tem um modelo de jogo. Tem um treinador competente que se encontra num patamar tático de excelência e cujo trabalho se reflete dentro do campo, No entanto nem sempre foi assim. Nos últimos 30 anos frequentemente o desnorte tático chegou a ser tal que bastava aparecer um Poborsky ou um Brian Deane para que, de um dia para o outro, se notasse uma subida de nível da equipa, sendo esta subida apoiada apenas no talento individual desses jogadores.
Hoje é diferente. É difícil a um jogador chegar ao Benfica, entrar no onze e começar de imediato a produzir a 100%. E mais grave ainda se esse jogador não fez a pré-época. É para mim evidente que Jorge Jesus exige a todos os seus jogadores que conheçam todas as posições, especialmente na organização e transição defensivas.
O que acabo de dizer é a explicação que justifica o péssimo resultado e a péssima exibição que o Benfica fez ontem na Alemanha.
Com Cristante no meio e Derley na frente, o Benfica foi incapaz de sair da primeira zona de pressão do Bayer, que é o ponto forte dessa equipa e para a qual ontem tinha chamado a atenção. A posição de pivot, a mais importante no esquema de Jorge Jesus (Matic dixit), e contra uma equipa que tem como principal arma a pressão alta e que faz tudo para não deixar o adversário respirar, o jogador que joga a pivot tem que conhecer como a palma da sua mão as rotinas da sua equipa. Infelizmente, Cristante não conhece bem essas rotinas. Aliás, ele ainda não as conhece. Ponto.
Derley foi outro dos problemas pois impediu o jogo direto quando a equipa se encontrava bastante pressionada. Lima, sendo de estatura mais elevada, poderia receber mais jogo aéreo e, com as suas descaídas para as alas e a capacidade de reter a bola, conseguiria permitir o alívio para essas zonas a fim de permitir ao Benfica subir no terreno.
Jorge Jesus esteve pois, no meu entender, muito mal na abordagem a este jogo. O Bayer joga muito bem e faz uma primeira e segunda linhas de pressão demolidoras. O Benfica não soube ultrapassá-las, pelos motivos que ilustrei.
Reafirmo que a equipa demorará ainda algum tempo a aproximar do seu potencial máximo o seu real valor. Até lá, é muito importante controlar os danos, ou seja, procurar não perder muitos pontos.
Quando hoje comecei a ler a capa do Record pensei que tinham percebido exatamente o que se passou. No entanto, quando acabei de ler reparei que o título era apenas um feliz trocadilho; para mim o título mais acertado teria sido "Dores de Crescimento", pois foi isto que se passou ontem. Continuará a ser assim nos jogos com adversários fortes, com equipas já estruturadas. Talisca ainda não compreendeu nem metade do que lhe é pedido, Lima está mal e Jardel não passará do que já é hoje. Por isso a equipa necessita de novos intervenientes, ou pelo menos de mais e diferentes opções. De momento, jogadores como Bébé, Pizzi, Lisandro López, Samaris, Cristante, Jonas e Derley ainda não conhecem suficientemente as dinâmicas da equipa para que consigam participar no jogo e serem verdadeiras mais valias. O seu tempo chegará, mais mês menos mês, mas por agora temos de nos contentar com o que há. A aspirina de ontem pode ter-nos causado uma forte dor de cabeça, mas serviu para que se perceba que há ainda um longo caminho a percorrer.
No domingo temos pela frente o Arouca, que no ano passado nos arrancou um empate. É preciso ganhar porque só ganhando as dores de crescimento diminuem e se consegue crescer.